
« ....São agora as mulheres. Não ousadias de guerra, que elas nunca empunham arco ou lança nas lides da peleja. Requebros e ademanes sáficos. Odaliscas que, quando luta pela vida dá tréguas aos seus senhores, lhes excitam os nervos para os prazeres da carne e lhes lembram que há em seus corpus doçuras compensadoras de todas as fadigas.Não há, em regra, beleza alguma a adorná-las. Na sua maioria, são encarquilhadas, sujas e feias. Excepcionalmente, algumas, bem poucas, apresentam-se dum encanto exótico, misterioso, antigo, do templo de Salomão ou dos faraós do Egito.Ora se saracoteiam, meio curvadas, prestes a cair, meneando os braços abertos e as nádegas gordurosas em moganguices concupiscentes e requebros pornográficos; ora se erguem em desafio e sacodem o busto farto, a mostrar aos homens, em círculo à sua volta, a exuberância dos seios entumecidos.»
.
Sinfonia Bárbara, 1935 (pag. 64)
« ...Nem a mais leve brisa acaricia as vergônteas, imóveis como se houvessem sido petrificadas, nem as borboletas, abundantes por êstes sítios, tão vistosas em sua garridice de côres, procuram com a tromba espiralada o pólen adocicado de escassas leguminosas. O activo colibri africano não adeja agora em tôrno às corolas procurando os insectos da sua alimentação. Não se ouve o gemer enamorado das rôlas nem o grito metálico do galo do mato. Afundou-se a vida na tumba do silêncio. A Natureza adormeceu, amodorrada pelo soalheiro, exausta de calor e de sêde. Paira no ambiente uma expectativa tenebrosa. Recolhidos em seus quartéis, os habitantes dêste logar que vivem em contacto com o mundo da matéria bruta e conhecem os seus ardis, dispõem-se resignados a suportar os rigores da calamidade.»
. ...
« ...Gritam, galos do mato, empoleirados nos braços musculosos dos imbondeiros. Afloramentos de granito, como répteis gigantescos, aquecem o dorso negro ao flamejar do soalheiro. Assustadas, refugiam-se codornizes, em voo estrepitoso, no mais denso das moitas de espinheiras. Esbracejam, em atitudes desengonçadas de esqueleto, os galhos rugosos de mitiáti, pobremente enfolhados.
!Paisagem monótona, despida de pompas, assoalhada mas triste, a perder-se por léguas!
Luta renhida pela existência! O folhedo a pedir angustiado à calidez do céu uma gota benéfica de orvalho; raízes contorcidas, espalmadas rés-vés com o solo, serpeando ou enroscando-se como jibóias; garrunchos grosseiros e disformes, gretados e negros; troncos encarquilhados como velhos mendigos, curvados em gibosas nodosidades; raízes aéreas, grossas como cordas, em fartas madeixas pendentes dos braços gretados das escassas frondes, outros tantos dedos inertes, caídos em atitude de desalento, a pedir inutilmente ao espaço a esmola que a terra implacável lhes não quer dar.
E sempre assim, léguas e léguas andadas pelo mesmo brejo agreste, calcorreando por entre herbagens como fios de arame, duras e praganosas, furtando o corpo às garras dilacerantes de espinheiras arbustivas, revoltadas contra a sua morte malfazeja.»
!Paisagem monótona, despida de pompas, assoalhada mas triste, a perder-se por léguas!
Luta renhida pela existência! O folhedo a pedir angustiado à calidez do céu uma gota benéfica de orvalho; raízes contorcidas, espalmadas rés-vés com o solo, serpeando ou enroscando-se como jibóias; garrunchos grosseiros e disformes, gretados e negros; troncos encarquilhados como velhos mendigos, curvados em gibosas nodosidades; raízes aéreas, grossas como cordas, em fartas madeixas pendentes dos braços gretados das escassas frondes, outros tantos dedos inertes, caídos em atitude de desalento, a pedir inutilmente ao espaço a esmola que a terra implacável lhes não quer dar.
E sempre assim, léguas e léguas andadas pelo mesmo brejo agreste, calcorreando por entre herbagens como fios de arame, duras e praganosas, furtando o corpo às garras dilacerantes de espinheiras arbustivas, revoltadas contra a sua morte malfazeja.»
.
da "Terra Conquistada", 1946
1º prémio de «Literatura Colonial»
« ...A indumentária de Catuane, essa é que era realmente assombrosa. Fazia a inveja e a cobiça de quantos a admiravam. Botas de cano largo, até meio da perna, de solas ferradas; calções à Chantily, às riscas azuis e brancas, chapeadas de cabedal em figuras geométricas; espessas meias vermelhas de lã que chegavam aos joelhos, saindo dos canos das botas; uma blusa feita de retraços de pergamóide de diversas cores, unindo ao meio por um fecho éclair; além dum casacão enorme, tão felpudo que era inteiramente aceitável ter pertencido ao espólio de algum alpinista. Na cabeça, um grande chapéu à cow-boy, de alta copa e de aba larga revirada, com duas penas de galo espetadas no alto. Óculos preto e uma sombrinha de senhora completavam a carnavalesca indumentária. A atravessar o lóbulo de uma das orelhas uma caneta de tinta permanente.»
(In Eduardo Correia de Matos, Terra Conquistada, pp. 176,177)
Eduardo Correia de Matos era meu avô paterno.
Fresquinha,
ResponderEliminarMuito interessantes extractos dos Livros do teu Avô!
Estão à venda onde?
Foi dele que herdáste? O jeito?
E o amor por África?
:-))
Fiquei a pensar!
ResponderEliminarExtractos soa-me mal, a palavra correcta será excertos!?...
:-)
Bom!
ResponderEliminarStrix.
Não tenho jeito nenhum embora tenha escritores dos dois lados: mãe e pai. Era pano de outra fibra.
ResponderEliminarVi esta indicação num blog :
Africa. Conjunto de 2 títulos em 2 vols. brs.
ÁFRICA. Conjunto de dois (2) títulos em 2 vols.brs. : 1 - CORREIA DE MATOS, Eduardo. SINFONIA BÁRBARA. Lourenço Marques, Livraria Académica, 1935. In - 4º de 300 págs. Br. Capa frágil e solta. Romance passado em Angola e Congo, com muitos dados etnográficos, caça, bot_nica, etc.; 2 - PIMENTA, Eduardo. D'AQUEM E D'ALÉM. Lisboa, Lumen, 1922. In - 4º peq. de 137 págs. Brochado. Capa frágil e solta. Contos de grande emoção, alguns deles passados em África. Invulgares estes dois títulos
http://www.pcv.pt/allLots.do?sessionid=&auctionid=6
no Palácio do Correio Velho, Leilões e Antiguidades, SA
leilão nº 167 - (15 a 30 Euros)
Gostei muito.:)
ResponderEliminarBFS*
;)
És uma pessoa de bomgosto. Não me decepcionáste. Obrigada.
ResponderEliminar:-)