um pouco de música clássica

A Maldição e o Medo do Número 9

Mozart fez 41 sinfonias; Haydn, 104; Brahms escreveu apenas 4 e Shostakovitch pretendia produzir 24, mas ficou em 15. Porém, quatro dos maiores sinfonistas compuseram 9 e logo morreram, forjando o mito de que a nona, ou a décima, é fatal. Apenas para efeitos dramáticos, vamos considerar que estes 4 sejam os maiores do gênero. Neste caso, é como se o capeta sempre entrasse em campo quando o imortal pretendesse chegar ao número dez. Aviso: não sou numerologista e não dou a menor importância a este tipo de - creio! - crendices.

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Ludwig van Beethoven (1770-1827) está em qualquer selecção de maiores sinfonistas. Se alguém o deixar de fora, merece internação imediata. Beethoven fez da 9ª Sinfonia seu testamento musical. Com problemas de saúde cada vez mais notórios, o compositor teve tempo de preparar sua despedida com a maior de suas sinfonias, a nona. Ele inaugurou nosso sortilégio e se o leitor não tiver muita intimidade com o mestre, dê preferência à audição das sinfonias Nº 3, 5, 7, 8 e 9.

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Franz Schubert (1797-1828) morreu um ano depois, logo após escrever a sua nona. A curiosiodade é que sua oitava sinfonia é conhecida como a Inacabada. E estamos certos em chamá-la assim, pois Schubert abandonou-a ao quando compôs os temas que utilizaria na última. A Sinfonia Nº 9 também é conhecida, com total merecimento, por "A Grande". Também vale a pena ouvir, além das citadas Nº 8 e 9, a 4 e a 5.

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Anton Bruckner (1824-1896) é outro dos grandes sinfonistas indiscutíveis. Pode-se quase dizer que se dedicou apenas a este gênero. Além delas, compôs apenas 3 Missas (uma é extraordinária), 1 Te Deum e pouquíssimas obras de câmara. Seus contemporâneos o consideravam quase como uma criança idiota e a opinião a este respeito é tão unânime que deve ser verdade. Porém, se você continuar a chamá-lo de burro após ouvi-lo, ficarei desconfiado de você. Deve tratar-se do idiota mais complexo de que se tem notícia, o que prova que a inteligência musical sobrevive mesmo em um cérebro limitadíssimo. Há duas curiosidades a seu respeito. A primeira é que Bruckner, já agonizando, quis que seu Te Deum fosse acrescentado como último movimento de sua 9ª. Não foi atendido; era um evidente absurdo. A segunda é que ele é o único compositor que possui uma sinfonia Nº 0, isto mesmo: Zero, Null ou Study Symphony. É que após a publicação das primeiras sinfonias - e de seu estrondoso sucesso - Bruckner resolveu completar um esboço de sinfonia escrito na juventude. Para não demonstrar uma possível involução em seu estilo, denominou-a Zero. Indico fortemente as sinfonias Nº4 (Romântica), 5 (que possui um adágio estarrecedoramente belo), 7 e 9 (ambas espantosas).
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Gustav Mahler (1860-1911) é o caso mais explicíto de medo à 9ª. Contrariamente a Bruckner, era um intelectual e regente respeitadíssimo na Viena da virada do século. Mahler tinha grande temor de escrever sua nona sinfonia e dizia isto a todos. Quando compôs a oitava (Sinfonia dos Mil), resolveu fazer uma pausa e atacou "A Canção da Terra" (Das Lied von der Erde), que talvez seja sua maior obra, mas que, cá para nós, é uma sinfonia camuflada de ciclo de canções. Com isto, pensou ter enganado o capeta. Só então escreveu sua nona e, por uma distração do diabo, conseguiu até escrever o primeiro movimento da décima mas.... morreu sem compor os outros movimentos.

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Por isto, aconselho a todos os candidatos a compositores eruditos que evitem o gênero ou o utilizem com parcimônia. Afinal, está provado: a décima pode matar.

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(autor desconhecido)