segunda-feira, fevereiro 19, 2007

novo-riquismo literário


Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar "afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via gramatical – isto tem sido um fartote pegado! As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber menção de "auxiliares de apoio doméstico".

De igual modo, extinguiram-se nas escolas os "contínuos"; passaram todos a "auxiliares da acção educativa". Os vendedores de medicamentos, inchados de prosápia, tratam-se de "delegados de informação médica". E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em "técnicos de vendas".

Os drogados transformaram-se em "toxicodependentes" (como se os consumos de cerveja e de cocaína se equivalessem!); o aborto eufemizou-se em "interrupção voluntária da gravidez"; os gangues étnicos são "grupos de jovens"; os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas, essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são "centros de decisão nacionais".

A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia: «Tenho uma família mono parental...» – eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade impante.

Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo". Do mesmo modo, e para felicidade dos "encarregados de educação", os brilhantes programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito, "crianças de desenvolvimento instável".

Ainda há cegos, infelizmente, como nota na sua crónica o Eurico. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado "invisual". (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o "politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais...).

E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico.




Autor desconhecido
Obrigada, Rita

5 comentários:

Anónimo disse...

Por acaso tinha ideia que " o comportamento disfuncional hiperactivo" fosse outra coisa.

Fresquinha disse...

No meu tempo era mesmo "falta de educação"... :-))) Não sei a que te referes :-)

Mano 69 disse...

E anão?
Pessoa de crescimento restrito.

Fresquinha disse...

Ou de c rescimento prescrito.:-)

Fresquinha disse...

Circunscrito, também:-)