"O pintor surpreendido por uma admiradora nua" - Lucien Freud
A linguagem da pornografia é muitas vezes demasiado semelhante à do puritanismo. Num artigo sobre a moral do linchamento dos meios de comunicação sofrido por Lucien Freud, após a exibição de uma das suas pinturas, Rafael Argullol reflectiu há um par de anos atràs, sobre as semelhanças entre estes estranhos companheiros de cama. Será a sociedade ocidental tão libérrima e desinibida como soa, ou as velhas proibições foram substituídas por outras recém-formadas ? Não é comum ver a formiguinha dos media exercer o seu papel de guardião da moralidade e dos bons costumes (quer em matéria de drogas, quer em relação a sexo)?
Algumas respostas:
"Os novos puritanos não pertencem, de facto, a qualquer país em concreto, mas funcionam como representantes da moralidade única, aquela que todos nós devemos aceitar com a mesma naturalidade com que assumimos que o capitalismo é o único modelo aceitável. Para este novo puritanismo, é perfeitamente lógico apoiar a gigantesca indústria da pornografia, enquanto se decide quem deve ser acusado de imoralidade. O novo puritano sabe distinguir claramente entre a depravação e o mercado, sendo este último, na sua essência, inocente de todas as acusações.
O que é verdadeiramente insuportável para a aliança com o puritanismo é o erotismo, ou a liberdade e incerteza que envolve, face à obscenidade do maniqueísmo moral. Nos nossos meios de comunicação social, o corpo varia entre a apresentação da carniçaria e a subjugação em tribunal, entre a utilização e a condenação. A imprensa e o contentor de televisão exibem-no e destruem-no com a mesma facilidade. A instantaneidade que se exige ao puritano e ao pornográfico choca com a complexidade da descoberta erótica.
E talvez seja este anti-sensualismo da nossa sociedade, camuflado num sufocante exibicionismo comercial, que explica factos aparentemente tão ridículos como o da acusação contra o preverso Lucian Freud no seu último quadro. Contudo, o pornográfico puritano poderia dar, para além dos nomes de Gauguin e Nabokov, uma longa lista de pervertidos:
- Sócrates : Lembram-se de Fedro?
- Dante e Petrarca : Lembram-se de Beatriz e Laura?
- E a maioria dos pintores da Renascimento.
Para o puritano tudo é suspeita de perversão, menos a pornografia.
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