domingo, setembro 02, 2007

escapadinhas

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Turismo Rural

Trata-se de um desporto nacional que antes se chamava "ir à terra". A diferença é que se fores à tua terra, vais de borla, e se fizeres turismo rural vais a uma terra que não é a tua e pagas uma pipa de massa. Para fazer turismo rural não serve qualquer terra. Tem de ser uma Terra "com encanto".

E o que é uma terra "com encanto"?
Obviamente, é uma terra que está num guia de terras "com encanto". Está-se mesmo a ver. A estas terras chega-se normalmente por uma estrada municipal "com encanto", que é uma estrada com tantos buracos e tantas curvas que quando chegas à terra estás mortinho para sair do carro.

E quando entras no café tentas integrar-te com os vizinhos.
- Bom dia, compadres! O que é que é típico daqui?
E o gajo do café pensa: "Aqui o típico é que venham os artolas da cidade ao fim-de-semana gastar duzentos contos".

A seguir, ficas instalado numa casa rural ou "casa com encanto", que é uma casa decorada com muitos vasinhos e réstias de alhos penduradas do tecto, que não tem televisão, nem rádio, nem microondas.
Em contrapartida, tem uns cabrões de uns mosquitos
que à noite fazem mais barulho que uma Famel Zundapp.

Depois apercebes-te que os da terra vivem numas casas que não têm Encanto nenhum, mas têm jacuzzi, parabólica, Internet e video-porteiro. A tua casa não tem video-porteiro, mas tem uma chave que pesa meio quilo.

Outra vantagem de fazer turismo rural é que podes escolher entre uma Casa vazia ou ir viver com os donos da casa.
Fantástico!!! Vais de férias e, além da tua, ainda tens de aguentar uma família postiça. Que à noite queres ver o filme, eles os documentários e tu perguntas-te: "Quem é que manda mais? Eu, que paguei 600 euros ou este senhor que vive aqui?" Ganha ele, que tem um cacete.

Ainda por cima, dizem-te que tens "a possibilidade de te integrares nos trabalhos do campo". O que quer dizer que te acordam às cinco da manhã para ordenhar uma vaca. Não te lixa?


É como ires à bomba da gasolina e teres de pôr tu a gasolina, ou como ires ao McDonalds e teres de arrumar o tabuleiro. Ou seja, o normal.


Então, levantas-te às cinco para ordenhar as vacas. E digo eu: porque raio é que é preciso ordenhar as vacas tão cedo? O leite está lá! Não se podem ordenhar depois do pequeno-almoço? Eu acho que isto é só para chatear, porque a vaca deve ficar muita contente por a acordarem às cinco da manhã para um estranho lhe vir mexer nas mamas.

A vaca olha para ti como se dissesse: "Ouve lá, pá! Se queres leite vai ao frigorífico e abre um pacote!" É que é mesmo só para chatear!!!

Mas o "encanto" definitivo são "as actividades ao ar livre". Como quando te põem a fazer caminhada, que é aquilo a que normalmente se chama andar, e consiste, exactamente, em por um pé em frente ao outro até não poderes mais, enquanto os da terra vão num jipe com ar condicionado. Mas tu feliz da vida.
Vais pelo campo atordoado. Tornas-te bucólico e tudo te parece
impressionante: vês uma vaca e dizes: "Ummmmm, que cheirinho a campo". A campo não, a bosta!!! Mas, isso sim, é o bosta "com encanto". E tudo, seja o que for, te sabe maravilhosamente: na mesa pespegam-te dois ovos estrelados com chouriço e tu na cidade não comes estes ovos, nem estes chouriços. E perguntas ao empregado?
- Este chouriço é da matança?
- Quase, porque o gajo do camião da Izidoro ia morrendo ali na curva.

De repente, ouves umas badaladas e dizes:
- Ah! Que paz! Não há nada como o som de um sino!...
E o gajo do café diz-te:
- É gravado. Não vê o altifalante no campanário?
Nesse momento, perguntas-te se os ruídos das galinhas e dos grilos Não estarão num CD: "RuralMix2006", "Os 101 Maiores Êxitos Campestres".
A única coisa de que tens a certeza é que os cabrões dos mosquitos são verdadeiros.
Pareces um Ferrero Rocher com varicela!!!

Eu acho que, de segunda a sexta, as pessoas destas terras vivem como toda a gente, mas ao fim-de-semana espalham pela estrada uns tipos mascarados de pastores e quando veêm que se aproxima um carro, avisam os da terra pelo telemóvel: "Hey, vêm aí os do turismo rural!" E mudam o cartaz de "Videoclube" pelo de "Tasca", soltam uns cães pelas ruas e sentam à entrada na terra dois avôzinhos a fazer sapatos, que depois tu compras uns e saem-te mais caros que uns Nike.
Enfim, acho que uma montagem tão grande como esta não pode ser obra de pessoas isoladas. Tenho a certeza de estão implicadas as autoridades.

Imagino o Presidente da Câmara: - "Queridos conterrâneos: este Verão, para aumentar o turismo, vamos importar mais mosquitos do Amazonas, que no ano passado tiveram imenso êxito. E quero ver toda a gente com boina, nada de bonés de pala da Marlboro. E façam o favor de pintar o espaço entre as sobrancelhas, que assim não parecem da província! E as avós: nada de topless na ribeira, que espantam os mosquitos! E só mais uma coisa: este ano não é preciso ninguém fazer de maluquinho da terra, que com os que vêm de fora já chega!

9 comentários:

Anónimo disse...

Fresquinha espantoso!
Subscrevo-me o short comentário do "Infiel" no "A Velha Menina" dou AQUI os Parabéns à Menina que tem um espírito jovem bem-disposto e hiper-criativo. Uma maravilha!
Famel Zundapp ...já nem me lembrava que existiu!!! Mas penso, pormenor irrelevante já que o que conta é o conteúdo a ironia do post-text, que Famel era uma marca portuguesa e outra a Zundapp, a mais comum aqui na zona de Lisboa e arredores era a Santamaria.
Coisas que já não me lembrava que existiram há que anos ...
Thanks Fresquinha pela tua descoberta, :)) xico

lixo disse...

Não tenho casa de turismo rural. Estas casas nasceram para "levar os intelectuais" armados em defensores da ruralidade e da natureza.E ganhar algum dinheirinho... Os rurais também sabem fazê-las... São normalmente urbanos,os visitantes, já sem laços à sua terrinha,e á sua casa e origens, que no fundo, no fundo,abominam, porque lhes lembra a opção de terem partido e os seus porquês, e o seu passado esquecido e arrumado. Ah! se a "velha" casa fosse um solar com esses defeitos todos apontados, mas fosse próprio... Isso dava para comentar de outra maneira. Assim, sem laços que os prendam, sem o pardieiro de onde fugiram, sem história na família,já sem vacas para os suster, e sem conhecer bem o que acoteceu, e com a vitória(?)(merecida aliás) na urbe, com todas as modernidades e acessos possiveis, ir ás pseudo-origens e criticá-las, melhora o ego e a vaidade.Único conselho... Vão experimentar o turismo rural. Depois, fujam para Cuba, França, Espanha, sei lá... e gastem os duzentos euros pois eles agradecem também. Mas façam comparações honestas.
Alcaide

Fresquinha disse...

Alcaide,

O texto que apresentei é a uma opinião satirizada de alguém que obviamente não gosta de fazer turismo de habitação mas que também tem alguma razão na forma como vê o que chamamos de santa terrinha. Hoje em dia, as nossas aldeias estão muito desvirtuadas. Calhas de alumínio por todo o lado, é uma. Vais a Sortelha (que eu adoro) e vês que no meio de tanta autênticidade, esse facto não passa desapercebido. O que mais mudou, foi sem dúvida a atitude do nosso aldeão. Também ele adoptou os defeitos das nossas urbes, num cenário que não lhe é próprio. Muitas outras pessoas terão uma opinião diferente. Como a tua que respeito. Mas não deixa de ser uma forma de ver o problema com uma certa graça. Não há uma verdade, há várias verdades. Vivo no campo, tenho uma herdade, e seria a primeira a defender o turismo rural. E defendo. Adoro. Mas ponho-me nos sapatos de quem não gosta e sorrio. Não vale a pena armar uma discussão politica àcerca de tudo. As coisas teem a dimensão que lhes queiramos dar. E é prefeitamente lícito ir a França, a Cuba, ... porque não ? Outras culturas que nos dão este jogo de cintura e maior tolerância à opinião alheia. Obrigada por teres comentado.

Há muito que não aparecias ...Beijo

Anónimo disse...

Fresquinha, Sortelha já fui convidado para lá à casa/tb turismo de habitação da xxx mas por uma ou outra razão nunca lá fui! a minha + velha vai para lá muito.
Próximo convite aproveito tua opinião ... vou!
Beijo, xico

Anónimo disse...

Deiam condi�es aos habitantes para a conserva�o do patrim�nio... Classifiquem-no como deve ser. Ajudem as pessoas que s�o alde�es distorcidos j� mas continuam na aldeia... e vivem nas casas. E deiam prioridades. e ensinem. Muito bonito uma janela de madeira, mas pre�o e conserva�o?... ajudem! IPPAR ao trabalho... acabem com a corrup�o nas C�maras e no Turismo para atribui�o das verbas de apoio ao patrim�nio. E sejamos honestos.E que o turismo rural seja incrementado ainda mais.. � a �nica maneira de fazer boa conserva�o. E ensinem as vacas e as moscas... Se calhar o urbano nem sabe a difren�a entre um boi e uma vaca!E nem lhe faz mal relembrar a vida dos seus ancestrais. Mas criem regras rigidas. E trabalhem.Tamb�m tenho campo e vivo numa casa hist�rica e sei o que os habitantes passam para fazer seja o que for.
Como � que falas da minha opini�o, se a n�o conheces?... S� me insurgi pelo "gozo" aoturismo rural.

Fresquinha disse...

Fazes jus ao teu nick, Sr. Alcaide. Pois eu, na minha humilde opinião, não acho que as pessoas se dividem em aldeões e urbanos, como fazes crer. Eu acho que pessoas são pessoas. Todas elas com características diferentes. Não deixa de ser verdade que as nossas pobres autarquias não conseguem oferecer equipamentos adequados a quem vive ou passa por diferentes locais. Nas grandes urbes, temos um problema igual em maior escala. Compreendo a tua revolta.
Bem sei que uma calha de alumínio, em termos de manutenção, tem a sua vantagem. Mas se quisermos preservar tradições e genuidade para oferecermos aos que por lá passam, teremos que conservar as características que as mesmas aldeias proclamam. Dá tanto trabalho manter as janelas e as portas em madeira como dava antigamente. E é desolador, ver esta miscelânea de elementos tradicionais com o mau do progresso.

O urbano sabe a diferença entre um boi e uma vaca. Por ter sido obrigado a viver na cidade porque não tem condições nas pequenas localidades, não é um perfeito idiota. Muitos urbanos vieram justamente do campo e por isso transmitiram aos idiotas urbanos essas pequenas noções zoológicas....
Eu sou tipicamente urbana, com uma paixão pelos meios pequenos, sobretudo no litoral. Vivi nos dois lados. E não deixei de ser quem era pelo simples facto de mudar de lugar.
Não queria era falar de verbas e apoios que foram dadas aos agrários, e que foram directamente para o bolso ... houve quem passásse férias no Algarve com os subsídios para o milho e o girassol ... cenas da vida campestre.

Fresquinha disse...

Ah ...Alcaide ... permite-me que te diga també que pelo facto de se satirizar uma vivência qualquer não quer dizer que se esteja a gozar com as pessoas. Penso que o autor deste texto estava essncialmente a gozar com ele próprio. É a melhor forma de humor. Humor é uma forma superior de inteligência.

Gozo pressupõe humilhação inferida sobre alguém. Aconselho-te a reler para veres que ninguém gozou com ninguém.

Só espero que continues a argumentar neste blog porque é tão importante interagir, mesmo que não concordemos aqui ou ali. Beijo

Anónimo disse...

O autor do texto gozou com ele próprio, e não há dúvida que o deve fazer...sempre.Falei de gozo, com o turismo rural... não gozei com os urbanos.Ou com os rurais. O turismo rural, volto a sublinhar , a meu ver devia ser das formas de turismo, das mais promovidas e aceites, atendendo á recuperação do nosso património.E criticá-lo da forma do texto não me parece muito correcto, até porque por azar, o "escrivão urbano", foi caír na casa de um "expert rural"...Falei no IPPAR, nas Câmaras , nos diversos intervenientes da conservação do nosso património. Esses é que deviam ser "gozados" nestas comunicações que tanta gente pode ler!E se existem janelas de aluminio.. e azulejos de WC nas paredes das casas, não deitem as culpas ao rurais, que tanto se sacrficam por manter esse património. Mas viver com condições...oblige!E sem apoios , informação, e regras,as coisas irão sempre de mal a pior.E por mim tenho dito, porque já me rewpito muitas vezes.

Fresquinha disse...

Desisto, Alcaide. Estamos a falar linguagens diferentes ...tu teimas em ter razão, eu teimo em ser feliz. Beijo