sábado, maio 03, 2008

sentimento démodé


Stephan Zweig diz tudo sobre compaixão no prefácio do seu livro "Coração Inquieto":
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"Há precisamente duas espécies de compaixão. Uma em que a impaciência que tem o coração de, o mais depressa possível, se libertar da emoção penosa ante o sofrimento alheio. A outra, a única de valor - a compaixão não sentimental, mas eficaz, que sabe o que quer e está decidida a paciente e compassivamente aturar tudo até o extremo de suas forças e mesmo ainda mais."
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Porque as pessoas, quando estão tristes e com raiva, olham para quem está tentando ajudá-las e dizem “não sinta pena de mim! Não preciso da sua piedade!”? Parece que virou moda isso, esse desprezo pela compaixão dos outros. Faz sentido, num mundo que exige apenas pessoas seguras, auto-suficientes e fortes, dizer algo assim. Mas que tipo de pessoa realmente faz isso, escorraça alguém que saiu do próprio caminho para estender a mão?

Uma das poucas coisas realmente boas que o cristianismo fez pela humanidade foi colocar a compaixão na ordem do dia, como uma virtude a ser praticada sempre, condição necessária para o paraíso. A piedade não era mais uma fraqueza de quem não era suficientemente bravo para vingar uma ofensa ou tomar algo para si.Hoje em dia, com várias virtudes cristãs saindo de moda (e boa parte delas já vai tarde), as pessoas simplesmente decidiram que sentir pena é uma forma de condescendência, uma ofensa terrível. Não, não podemos ter compaixão, temos que dar tapinhas nas costas da pessoa e dizer que “a vida continua, seja forte, levanta sacode a poeira e dá a volta por cima, é isso aí!” e perguntar quando ela vai devolver aqueles vinte euros que emprestamos na semana passada.

Provavelmente isso acontece porque se considera tão anti-natural uma pessoa estar triste, derrotada, com problemas ou sofrendo. Então a pessoa nessa situação é um leproso, que deve ser evitado com um leve constrangimento e que deve carregar um sininho, na forma de uma raiva mal-disfarçada e um orgulho falso, para avisar aos outros da sua infeliz presença. Afinal, alguém pode acabar se contagiando, ficando com dó, compartilhando a tristeza daquela pessoa, credo.
A própria palavra compaixão, na sua origem, significa “sentir junto”. Na minha opinião, é isso que nós devemos às pessoas que amamos: sentir as coisas junto com elas, boas ou más. Se ficamos felizes porque elas estão felizes, nada mais natural que a infelicidade dessas pessoas nos faça sofrer também. E isso é bom! Isso é um sinal de humanidade, quem é incapaz de sentir pena não é gente.

Nunca vou dizer que não sintam pena de mim. Se eu estiver na merda, infeliz, sofrendo, podem sentir pena. Por favor, sintam pena. Só me vai fazer bem saber que alguém vai sofrer um pouco porque se importa.
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Desconheço o autor
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Muita gente, talvez a maioria das pessoas, confunde compaixão com pena. Mas uma coisa não tem nada a ver com outra.
Sentir pena de algum ser ou do que quer que seja, significa que estamos nos sentindo numa condição superior à daquele ser, no sentido de que nos encontramos em uma situação melhor do que a dele, por não estarmos passando pelo mesmo sofrimento que ele vive naquele momento. E nesse caso, geralmente nos permitimos algum tipo de julgamento quanto a esse ser, ou mesmo quanto à situação que originou esse sofrimento.
Ter compaixão, no entanto, significa colocar-se incondicionalmente ao lado do outro, sem qualquer tipo de julgamento quanto à situação que ele está vivenciando, sem nenhum outro sentimento que não seja o de propiciar alívio à situação na qual aquele ser se encontra.
A compaixão exige de nós uma atitude, uma acção. Exige que nos coloquemos na situação em questão, e que nos ofertemos, ou a algo de nós mesmos, para que essa situação se resolva. Exige que estejamos presentes, que sejamos actuantes, que nos posicionemos.
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Como disse o Milan Kundera, em "A Insustentável Leveza do Ser", sobre essa compaixão, não com o substantivo sofrimento sendo passivo, mas sim sentimento:
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"A compaixão designa a mais alta capacidade de imaginação afectiva, a arte da telepatia das emoções.
Na hierarquia dos sentimentos, é o sentimento supremo"

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