domingo, outubro 01, 2006

à minha mãe


À minha mãe,
(In memorium)

Penso na velhice que te avassalou de repente, da dor que não dizias sentir, amparada à vida pelos grilhões das tuas mágoas. Penso no que navegaste sobre conchas de ar e de mar, dos nomes que escreveste nas areias das tuas praias, nos búzios que foste deitando, espreitando o futuro com os teus olhos de criança, batendo-te com bravura na tela dos teus desenhos.

Penso no amor com que embalavas o barco. Um barco de seis marinheiros. Nós e só nós. E era assim, como capitão de jangada, que guardavas os teus cinco raios de sol, no rumo dos teus caminhos.

Vi-te, sereia bela, olhar a vida de frente, arqueando a cauda ao nosso rasto, defendendo a prole das tempestades. Vi-te sorrir quando o infortúnio nos visitara por tantas vezes, inventando histórias de outras terras, de outros sonhos, de mais cores.

Vi brilhar os teus olhos de ébano no calor das manhãs de África, e senti-te o cheiro da terra. Vi a felicidade sentar-se na tua pele, até mesmo por instantes.

Vi-te bailar e dançar, entre as crianças que ensinavas, cantando as vitórias de um passado e sonhando histórias de princesas.

Contei, e perdi a conta, as pérolas de mar que te saltavam da face ao esbarrar nas falésias de ilusão. E que foram tantas …

Eras uma criança que não tinha crescido, cabeça cheia de sóis e de ventos …

Venho dizer-te, mãe, que aquilo que me deste foi muito mais que este oceano imenso.

E, que existem tantos mares, tantos oceanos, mas não há sereias como tu.
Deixa-me dar-te o alento que precisas, deixa-me aquecer-te as mãos que se deitam no teu colo, esperando, resignadas.
Leonor de Saint Maurice

4 comentários:

SaoAlvesC disse...

Fizeste-me lembrar a minha mãe e os campos de girassóis que a fascinavam... a minha mãe que não era sereia, mas borboleta sempre atrás das suas flores, dos seus quadros, de tudo o que fosse belo. Que tinha ar de menina mimada e inventava histórias de princesas para mim e julgo que para ela mesma. Faz-me tanta falta, ela e a minha avó!

Fresquinha disse...

Eu ainda tenho uma avó. Por isso ela não me faz grande falta. Da minha mãe, sim. Todos os dias. E a saudade é coisa que aumenta. Nunca diminui.


PS Segundo um amigo comum, eles não sentem a nossa falta. Porque estão sempre ao nosso lado :-)Acredita.

BiChOs Do MaTo disse...

Ainda bem que tenho a minha mãe comigo, não sei o que faria sem ela..........principalmente neste momento.
Adoro a minha mãe e já agora o meu pai tb.......
Lara

Anónimo disse...

Só quem passa pela perda, entende o quanto ficou por amar. Ainda tenho o meu pai por cá que adoro também e tento dar-lhe a atenção que preciso para não me vir a arrepender. Nem sempre consigo.