domingo, novembro 18, 2007

confabulação



Um dia, quando um homem chegou tarde a casa, cansado e irritado após um dia de trabalho, encontrou, esperando por si à porta, o seu filho de 5 anos.
- Papá, posso fazer-te uma pergunta?
- Claro que sim. O que é?
- Quanto ganhas numa hora?Isso não é da tua conta. Porque me perguntas isso?! - respondeu o homem, zangado.
- Só para saber. Por favor... diz lá... quanto ganhas numa hora? ? perguntou novamente o miúdo.
- Bom... já que queres tanto saber, ganho 10 euros por hora.
Oh! - suspirou o rapazinho, baixando a cabeça.
Passado um pouco, olhando para cima, perguntou:
- Papá, emprestas-me 5 euros?
O pai, furioso, respondeu:
- Se a razão de tu me teres perguntado isso, foi para me pedires dinheiro para brinquedos caros ou outro disparate qualquer, a resposta é não!E, de castigo, vais já para a cama. Vai pensando no menino egoísta que estás a ser. A minha vida de trabalho é dura demais para eu perder tempo com os teus caprichos!
O rapazinho, cabisbaixo, dirigiu-se silenciosamente para o seu quarto e fechou a porta.
Sentado na sala, o homem ficou a meditar sobre ocomportamento do filho e ainda se irritou mais. Como se atrevia ele afazer-lhe perguntas daquelas? Como é que, ainda tão novo, já se preocupavaem arranjar dinheiro?
Passada mais ou menos uma hora, já mais calmo, o homem começou a ficar com remorsos da sua reacção. Talvez o filho precisasse mesmo de comprar qualquer coisa com os 5 euros. Afinal, nem era costume o miúdo pedir-lhe dinheiro.
Dirigiu-se ao quarto do filho e abriu devagarinho a porta.
- Já estas a dormir? Perguntou.
- Não, papá, ainda estou acordado. - respondeu o miúdo.
- Estive a pensar... Talvez tenha sido severo demais contigo? - disse o pai. Tive um longo e exaustivo dia e acabei por desabafar contigo. Toma lá os 5 euros que me pediste.
O rapazinho endireitou-se imediatamente na cama, sorrindo:
- Oh, papá! Obrigado!
E levantando a almofada, pegou num frasco cheio de moedas. O pai, vendo que o rapaz afinal tinha dinheiro, começou novamente a ficar zangado.
O filho começou lentamente a contar o dinheiro, até que olhou para o pai.
- Para que queres mais dinheiro se já tens aí esse? - resmungou o pai.
- Porque não tinha o suficiente. Agora já tenho! - respondeu o miúdo. Papá, agora já tenho 10 euros! Já posso comprar uma hora do teu tempo, não posso? Por favor, vem uma hora mais cedo amanhã. Gostava tanto de jantar contigo...

2 comentários:

Anónimo disse...

Quanto em mim existe hoje daquele pai….e quanto já tive em outros tempos daquele menino!

Nos dias de hoje, dói só de confabular ser dono do tempo….muito mais quando não o podemos dar a um filho!

j2mseravat

Fresquinha disse...

Gosto da sua sensibilidade. Muito. E também da coragem de se rever nas situações que se lhe apresentam. Nunca é tarde para aprendermos a dar. Sabe, saímos (ou estamos a sair) de uma era consumista, em que o que valia era trabalhar para conseguir apanhar o barco dos bens materiais. Consumimo-nos, sim, para podermos TER aquilo que, de uma forma ou de outra, nos era "exigido". Trabalhámos e continuamos a trabalhar para não perder a qualidade de vida que conquistámos. Trabalhamos para pagar os vícios de uma vida confortável. Os tempos mudaram. Hoje trabalhamos demais, paramos de menos, porque outro factor está em causa a sobrevivência na precariedade do trabalho. As teias que tecemos, sem darmos (?) por isso.Pagamos pelo nosso erro. Enquanto trabalhámos para sustentar a nossa gula de ter, esquecemos tantas vezes a família e os amigos. É tempo de voltar a arranjar tempo. Tempo para estarmos com aqueles que mais gostamos e que tanto precisam de nós. Não há muito tempo, um amigo workaólico,queixava-se do pai insistir muito para beber um café. Nem tempo para um café ele teve tempo ou vontade para subvir à necessidade daquele pai de estar com ele. Nem mesmo para um café. Quando um pai pede tempo para um café, é grave: é tempo de pararmos e avaliarmos o que para nós é mais importante. Já nem se trata de estabelecer prioridades. A prioridade colocar-se-ia ao nível de uma necessidade. É mesmo vontade de ver um filho crescer, rir, estar calado, ...partilhar o vento que passa num momento vivido a dois. E não há mesmo nada que pague essa partilha. Não sei se o meu amigo terá entendido o meu discurso, na altura. Mas espero que sim.
Um dia, o filho dele dir-lhe-à que também não tem tempo para um café, porque preencheu a vida com outras coisas. E ele vai sentir-se só. Pense nisso.

Um beijo porque sei que vai a tempo de não estar só um dia.